O PRINCÍPIO DA
EFICIÊNCIA E A PARTICIPAÇÃO POPULAR: UMA RELEITURA SEGUNDO O ESTADO DEMOCRÁTICO
DE DIREITO
Lorena Brandizz
RESUMO: O presente artigo tem como
objetivo apresentar uma análise do princípio da eficiência da Administração
Pública sob a ótica do Estado Democrático de Direito. A partir da promulgação
da Constituição Federal de 1988, o objetivo da atividade administrativa passou
a ser a satisfação dos direitos fundamentais. Dessa forma, a hipótese a ser
defendida é que, dentro do Estado Democrático de Direito, a eficiência da Administração
Pública tem seu significado ampliado para incluir, além da noção original de
produtividade e celeridade, a ideia de participação popular. Assim, serão
apresentados alguns exemplos de medidas adotadas por órgãos da Administração
Pública que buscam a efetivação de uma democracia participativa ao permitir a
participação popular em seus processos de tomada de decisão. O objetivo final é
demonstrar que a atividade administrativa só é eficiente quando é capaz de
responder aos anseios da sociedade, garantindo-lhe o exercício dos direitos
fundamentais assegurados no texto constitucional, o que só é possível por meio
de uma participação popular efetiva.
PALAVRAS-CHAVE: Direito Administrativo.
Princípio da Eficiência. Participação popular. Democracia participativa.
INTRODUÇÃO
O Direito Administrativo evoluiu
juntamente com o Estado e a sociedade. Estudar a evolução do Direito
Administrativo é estudar as diversas mudanças que transformaram a própria estrutura
do Estado. Sendo assim, o presente artigo tem por objetivo analisar a
ressignificação operada recentemente sobre o princípio da eficiência da
Administração Pública. Para tanto, em um primeiro momento, será apresentada uma
breve retrospectiva a respeito das transformações pelas quais o Estado passou
até assumir a forma de Estado Democrático de Direito. Será possível perceber
que o Direito Administrativo acompanhou toda essa evolução para que suas regras
e princípios pudessem refletir os novos objetivos perseguidos pela atividade
administrativa.
Em um segundo momento, será
demonstrado que o princípio da eficiência no Estado Democrático de Direito está
profundamente associado ao novo objetivo da atividade administrativa, a saber,
a satisfação dos direitos fundamentais. Será constatado que o referido
princípio não pode mais significar tão somente a busca pela produtividade e
pela celeridade como um fim em si mesmo. A eficiência do Estado se revelará na
realização da sua finalidade precípua que, a partir da constitucionalização do
Direito Administrativo, passou a ser, conforme defenderemos ao longo de todo o
presente trabalho, a satisfação de todo o sistema de direitos e garantias
fundamentais. O papel do princípio da eficiência nesse novo cenário está
justamente na busca de processos e mecanismos que garantam que a Administração
Pública satisfaça esses direitos de forma econômica, célere e legítima, sem
deixar de observar os demais princípios que orientam a atividade
administrativa.
Por fim, dada a estreita relação
entre o princípio da eficiência e a própria noção de Estado Democrático de
Direito será defendida a hipótese de que a observação plena do referido
princípio só é possível no contexto de uma Administração Pública participativa.
Buscar-se-á demonstrar que, para que o Estado possa satisfazer os direitos
fundamentais da sociedade, faz-se necessário que essa sociedade tenha voz e a
use de forma direta. A Administração Pública tem o dever de fomentar a
cidadania o que deve ser feito não somente pela democracia representativa, mas
também por meio da democracia participativa.
1. A EVOLUÇÃO DO ESTADO E DO DIREITO
ADMINISTRATIVO
O
nascimento do Direito Administrativo ocorre juntamente com a concepção do
Estado Liberal de Direito. Inicialmente considerado inimigo do povo, pois
exercia a função de guarda noturno, esse Estado evitava intervir na ordem social
e econômica, pois o objetivo era preservar, assegurar e fomentar a liberdade
privada. No entanto, o tempo revelou que essa abstenção absoluta do Estado se
tornaria nociva no longo prazo. O que se observou foi o aumento progressivo e
descontrolado da desigualdade social, fazendo surgir a necessidade de normas de
ordem pública que pudessem proporcionar uma situação mais equilibrada.
Em virtude do crescimento
desenfreado da desigualdade social, começou a tomar forma o Estado Social de
Direito. O Estado passou a intervir de forma direta nas relações sociais e na
própria economia. Tratava-se de uma necessidade premente, pois as camadas menos
favorecidas da sociedade estavam à deriva, sem qualquer proteção e assistência.
Esse Welfare State, dada a
necessidade de participar de diversas áreas da sociedade, acabou passando por
um processo de hipertrofia. O aparato estatal se tornou gigantesco e, por isso,
lento e burocrático. O que se observou é que o gigantismo estatal acabava por
impossibilitar a consecução dos próprios objetivos que levaram à sua
transformação.
Após a constatação de que um Estado
hipertrofiado seria incapaz de garantir os direitos sociais de forma efetiva,
passou-se a buscar a desburocratização e a redução do aparelho estatal. Esse
novo formato de Estado que começou a surgir, o Estado Democrático de Direito, deveria
favorecer a descentralização da atividade administrativa, uma atividade que
agora estaria centrada em resultados e não em processos, como era o caso da
administração burocrática. Passava-se a adotar um modelo gerencial de
administração pública.
Rafael Carvalho Rezende Oliveira resume
bem todo esse processo de transformação do Estado ao tratar do fundamento do
Direito Administrativo. O autor afirma que
Quanto ao fundamento do Direito
Administrativo, o tema sofreu mutações ao longo do tempo, especialmente pelas
mudanças no perfil do Estado e da sociedade. Inicialmente concebido a partir da
noção de serviço público, o Direito Administrativo foi alargado e encontrou
fundamento na concepção tradicional do interesse público. Atualmente,
influenciado pelo fenômeno da constitucionalização do ordenamento jurídico,
parece adequado sustentar que o seu principal objetivo é a satisfação dos
direitos fundamentais. (OLIVEIRA, 2019, p. 4).
A
análise da Constituição Federal de 1988 é extremamente importante para a
compreensão de como essa transformação se operou na Administração Pública
brasileira, pois ela trouxe para o Direito Administrativo a centralidade dos
direitos fundamentais e concedeu força normativa a princípios que antes eram
apenas “orientadores” da atividade administrativa.
Uma
das mudanças mais significativas trazidas pela constitucionalização do Direito
Administrativo foi a redefinição da noção de supremacia do interesse público
sobre o privado. Atualmente, não se acredita mais na plenitude do referido
princípio. Há vários doutrinadores que buscam defender ou evidenciar a sua
mitigação.
Couto,
ao ser referir ao princípio da supremacia do interesse público, o conceitua
como “o anseio
de satisfação de uma necessidade social ou estatal considerada relevante à sua
época, podendo ser encontrado nos fragmentos comuns extraídos de alguns
interesses privados juridicamente protegidos (COUTO, 2019 p. 101).
Segundo
Couto, a satisfação dos direitos fundamentais está intimamente ligada à noção
de interesse público primário, pois o povo, ao eleger os seus representantes
por meio da democracia representativa, espera que o Estado, como um tudo,
garanta o exercício dos direitos que a própria Carta Constitucional lhes
assegura. O autor assinala, inclusive, que o próprio Ministério Público tem
legitimidade para exigir em juízo a satisfação de tais direitos. Nas palavras
do autor:
Em primeira análise, quase todos os direitos
fundamentais são exigíveis pelo Parquet, logo, mesmo havendo colisão entre o
direito fundamental vazado pelo interesse público primário e qualquer outro
interesse público primário, a natureza daquele resta intacta pela utilização da
ponderação de valores para o caso concreto. (COUTO, 2019, p. 107)
Percebemos que Couto faz referência à
ponderação como instrumento interpretativo a ser usado pelo julgador. A
ponderação está presente na doutrina constitucional moderna de forma
definitiva. Segundo Gilmar Mendes, em seu Curso de Direito Constitucional, o
princípio da reserva legal, a partir da aplicação da ponderação, se converteu
em princípio da reserva legal
proporcional. Trata-se da aplicação do princípio da proporcionalidade, que
abrange três subprincípios: da adequação, da necessidade e da proporcionalidade
em sentido estrito. A respeito desse último, o referido autor afirma que
(...) um juízo definitivo sobre a
proporcionalidade da medida há de resultar da rigorosa ponderação e do possível
equilíbrio entre o significado da intervenção par ao atingido e os objetivos
perseguidos pelo legislador (propocionalidade
em sentido estrito) (MENDES, 2017, p. 225) (grifo no original).
Percebe-se assim, que não há mais a
concepção de uma Administração Pública soberana e totalitária, que imponha de
forma unilateral um “abstrato interesse público”. Na verdade, o problema está
justamente aí: o conceito de interesse público é extremamente abstrato,
proporcionando espaço para arbitrariedades. Por essa razão, muitos
doutrinadores defendem a sua mitigação ou ponderação quando entra em conflito
com direitos fundamentais. Oliveira afirma que não se pode admitir que a
atuação estatal seja fundada sob um conceito tão “abstrato e indecifrável” com
este. Por isso, ele defende que seria mais interessante que se falasse em
princípio da finalidade pública reforçando-se a ideia de que o Estado não busca
um “interesse público” abstrato e obscuro, mas, por meio da ponderação, busca a
realização de “todos os interesses envolvidos” (OLIVEIRA, 2019, p. 50).
No
entanto, ainda há alguns autores que se posicionam de forma diversa, defendendo
a manutenção da supremacia quase absoluta do interesse público sobre o privado,
como é o caso de Carvalho Filho, como vemos no excerto a seguir.
Algumas vozes se
têm levantado atualmente contra a existência do princípio em foco,
argumentando-se no sentido da primazia de interesses privados com suporte em
direitos fundamentais quando ocorrem determinadas situações específicas. Não
lhes assiste razão, no entanto, nessa visão pretensamente modernista. Se é
evidente que o sistema jurídico assegura aos particulares garantias contra o
Estado em certos tipos de relação jurídica, é mais evidente ainda que, como
regra, deva respeitar-se o interesse coletivo quando em confronto com o
interesse particular. A existência de direitos fundamentais não exclui a
densidade do princípio. Este é, na verdade, o corolário natural do regime
democrático, calcado, como por todos sabido, na preponderância das maiorias. A
“desconstrução” do princípio espelha uma visão distorcida e coloca em
risco a própria democracia; o princípio, isto sim, suscita “reconstrução”,
vale dizer, adaptação à dinâmica social, como já se afirmou com absoluto
acerto. (CARVALHO FILHO, 2020, p. 35)
Apesar disso, o que resta
inquestionável é que o Direito Administrativo passou por um processo de constitucionalização
irreversível, coerente com a própria transformação do Estado. Um outro efeito
desse processo é a superação de uma concepção pura e absoluta do princípio da
legalidade, que mantinha a Administração Pública engessada em uma visão
positivista do ordenamento jurídico. Com o desenvolvimento do Pós-positivismo,
a Administração Pública passou a pautar a sua atuação não somente pelo
cumprimento da lei, mas também pela fiel observância dos princípios
constitucionais, pois, como vimos anteriormente, o seu objetivo final é a
satisfação dos direitos fundamentais. Segundo Oliveira, “a legalidade
encontra-se inserida no denominado princípio da juridicidade que exige a
submissão da atuação administrativa à lei e ao Direito” (2019, p. 39-40). O
autor explica que mais do que o respeito a leis esparsas, a Administração
Pública deve observância a um verdadeiro “bloco de legalidade” (p. 40).
Percebemos, assim, que o
desenvolvimento do Estado Democrático de Direito trouxe para o Direito
Administrativo uma completa releitura dos seus objetivos e mecanismos de
atuação. Conforme apontamos anteriormente, o Estado deve atuar com vistas a
efetivar os direitos fundamentais elencados na Constituição Federal. Há o
entendimento de que esse Estado estaria “destinado a assegurar o exercício dos
direitos sociais e individuais, a liberdade e a segurança” (MENDES, 2017, p.
133). Dessa forma, todos os princípios que informam o Direito Administrativo
devem ser observados dentro dessa nova ótica, inclusivo o princípio da
eficiência, conforme veremos a seguir.
2. UMA NOVA CONCEPÇÃO DO PRINCÍPIO DA
EFICIÊNCIA
O
princípio da eficiência tem suas raízes na visão de um Estado mínimo. Inicialmente,
ele surge como uma tentativa de harmonizar a atuação administrativa com
princípios de outras áreas do conhecimento como a economia, a administração e a
contabilidade. Vejamos o conceito de Nohara:
O princípio da eficiência foi positivado no caput
do art. 37 da Constituição Federal por meio da Emenda Constitucional nº 19, de
1998, que seguiu o passo das legislações estrangeiras. A menção à eficiência no
Direito Administrativo não representou uma grande novidade na medida em que ela
era estudada como dever específico nas atribuições do administrador. A
eficiência impõe ao agente público um modo de atuar que produza resultados
favoráveis à consecução dos fins que cabe ao Estado alcançar. Assim, antes de
sua positivação como princípio, os manuais a mencionavam como faceta exigida no
âmbito do dever funcional (2020, p. 93).
Conforme
apontado pela autora, a positivação do referido princípio apenas consolidou (e
normatizou) o entendimento de que o administrador deve buscar a realização eficiente
dos fins a serem alcançados pelo Estado. Ou seja, essa ideia já estava sendo
abordada pela doutrina, pois havia uma tendência geral à busca pela
produtividade na Administração Pública, como resposta àquela hipertrofia a que
nos referimos anteriormente: o Estado havia se transformado em uma máquina
ineficiente, lenta e improdutiva, mais focada nos processos do que nos
resultados.
No
entanto, o que se observou é que seria impossível aplicar de forma direta o
princípio da eficiência em sua abordagem neoliberal no contexto da
Administração Pública. Ora, os modelos e mecanismos que caracterizavam a
atividade privada não poderiam ser transpostos de forma direta para a atividade
administrativa do Estado. O Estado, principalmente em sua concepção
democrática, não tem como objetivo final a produtividade ou o lucro, mas o bem
comum e o desenvolvimento da sociedade.
Dessa
forma, o princípio da eficiência deve ser analisado a partir de uma nova
perspectiva, dentro de uma abordagem ampla e voltada para a defesa dos direitos
fundamentais. Bolzan de Almeida fala de “presteza, perfeição e rendimento
funcional” quando aborda o princípio sob análise, conforme vemos no trecho
abaixo:
Segundo os ensinamentos da doutrina, “a eficiência
exige que a atividade administrativa seja exercida com presteza, perfeição e
rendimento funcional”. Essa eficiência deverá atingir não só os agentes
públicos como também a própria Administração. Os agentes públicos deverão
atuar, da melhor forma possível, na busca dos melhores resultados. Já a
Administração deverá estruturar de forma racional sua organização, de modo a
atingir os melhores resultados a um menor custo possível. (BOLZAN DE ALMEIDA,
p. 50).
O
referido autor aponta para uma dupla observância do princípio da eficiência. É
necessário observar o segundo ponto de vista apontado pelo autor: ele salienta
que a Administração Pública deve buscar organizar-se de forma racional para que
o bem comum seja alcançado da melhor forma possível, mas ao menor custo
possível. O que se percebe nas ideias do autor é a própria necessidade de
ponderação. Não se busca uma economia cega, sem observância da qualidade dos
processos e serviços a serem oferecidos à população, mas uma atividade
administrativa “racional”.
É
interessante observar com atenção a ideia de racionalidade. Racional é o
processo que se organiza de forma coerente, com princípio, meio e fim. Há uma
ordem lógica, assim como há um esforço pela busca das melhores alternativas
para se alcançar um fim desejado. Conforme afirmamos reiteradas vezes, o fim
almejado pelo Estado, dentro de uma nova ordem constitucional, é a persecução
dos direitos fundamentais. Dessa forma, uma atividade administrativa “racional”
é aquela que buscar a melhor alternativa para a satisfação dos referidos
direitos.
Esse
entendimento é de fundamental importância para compreendermos a necessidade
premente de a Administração Pública adotar medidas que possibilitem a
participação popular nos seus processos decisórios, assim como na execução das
políticas públicas. A participação popular direta é indispensável para que o
Estado possa satisfazer as necessidades da população.
É
evidente que a democracia tem sido exercida por meio da representação popular:
o povo elege representantes que produzem leis que (presumidamente) irão
garantir a realização do bem comum. No entanto, já restou comprovado que a
democracia representativa não é suficiente para a satisfação plena dos direitos
fundamentais. A própria Constituição Federal positivou a necessidade de
participação popular.
Mazza
(2020) relembra que a Constituição Federal, em seu art. 37, §3º,
determina que a lei deverá estimular a participação do cidadão de forma direta
e indireta na administração. O autor lista algumas formas de participação:
a) reclamações relativas à prestação dos serviços
públicos em geral; b) o acesso dos usuários a registros administrativos e
informações sobre atos de governo; c) a disciplina da representação contra o
exercício negligente ou abusivo do cargo, emprego ou função na Administração
Pública (MAZZA, 2020, P. 117).
Dessa
forma, a participação acabou se tornando um princípio da administração pública,
cuja observância se faz necessária para a própria consecução dos seus
objetivos. O princípio da eficiência, associado à ideia de participação
popular, não pode mais significar tão somente a busca pela produtividade e pela
celeridade como um fim em si mesmo. Seu papel, nesse novo cenário, está
justamente na busca de processos e mecanismos que garantam que a Administração
Pública satisfaça os direitos fundamentais de forma econômica, célere e
legítima, sem deixar de observar os demais princípios que orientam a atividade
administrativa.
É
importante relembrar que princípios são regras
de otimização. Conforme ensina Robert Alexy (apud MAZZA, 2020), eles são
“regras que exigem que algo seja realizado “na maior medida possível dentro das
possibilidades jurídicas e fáticas existentes” (MAZZA, 2020, p. 110). Mazza,
citando o conceito apresentado por Alexy, explica que os princípios “caracterizam-se
por poderem ser satisfeitos em graus variados e pelo fato de que a medida
devida de sua satisfação não depende somente das possibilidades fáticas, mas
também das possibilidades jurídicas” (2020, p. 110).
Percebemos
assim, que os princípios administrativos têm como objetivo a otimização da
prestação da atividade administrativa. Sua natureza de regra de otimização lhes
permite a ponderação no caso concreto, ou seja, diante de um conflito entre um
princípio e uma norma, ou entre vários princípios, será possível a aplicação
parcial de um e outro princípio, o afastamento de uma norma ou mesmo a sua
interpretação segundo a Constituição.
Dentro
dessa perspectiva é que Oliveira afirma que a atividade do Estado Democrático
de Direito deve, além do respeito à lei e à Constituição, “pautar-se por uma
legitimidade reforçada” (OLIVEIRA, 2019, p. 53). Ora, a legitimidade está
vinculada a uma adesão da sociedade às políticas públicas e às medidas adotadas
pelo Estado para o alcança do interesse público. A sociedade não pode mais ver
a prestação estatal como um favor ou como uma atividade filantrópica. Ao
participar dos processos decisórios e executórios, a sociedade se reconhece
como destinatária da atividade estatal, mas, ao mesmo tempo percebe que o que
legitima a atuação do Estado é a consensualidade. Nas palavras de Oliveira:
A participação
popular no procedimento administrativo, nessa perspectiva do consensualismo,
revela-se um importante instrumento de democratização da Administração Pública,
pois permite uma melhor ponderação pelas autoridades administrativas dos
interesses particulares, identificando, com maior precisão, os problemas e as
diferentes conseqüências possíveis da futura decisão. Ademais, a participação
aumenta a probabilidade de aceitação dos destinatários das decisões
administrativas, constituindo, por isso, importante fator de legitimidade
democrática da atuação da Administração Pública. (OLIVEIRA, 2019, p. 53).
Percebemos assim, a importância de
uma releitura do princípio da eficiência segundo a ótica da participação
popular direta e do consensualismo. A discussão de políticas públicas, as
deliberações a respeito das medidas de satisfação das necessidades de uma comunidade,
a formação e a execução de tais medidas devem, necessariamente e na medida do
possível, ser abertas à deliberação popular, por meio de plebiscitos,
referendos, audiências públicas etc. Dessa forma, será possível que a
Administração Pública atue de forma racional, alcançando de maneira eficiente o
objetivo que orienta a sua própria existência: a satisfação dos direitos
fundamentais.
3.
PREVISÕES
LEGAIS DE MECANISMOS DE PARTICIPAÇÃO POPULAR
Oliveira
(2019, p. 54 e 55), apresenta alguns exemplos previstos na legislação
infraconstitucional, em que é possível observação a criação de medidas efetivas
de participação popular nos processos decisórios da Administração Pública. Um
desses exemplos é a exigência de que seja realizada uma audiência pública
quando a licitação alcançar um grande vulto econômico (Lei 8.666/1999, art.
312-34). Ora, os recursos que serão usados para custear o objeto dessa
licitação são recursos públicos, dessa forma, nada mais lógico (e racional) do
que permitir que a população participe dessa tomada de decisão.
Além
dessa hipótese, a Lei 9.784/1999, prevê a possibilidade de que audiências e
consultas públicas sejam realizadas durante os processos administrativos em
geral, influenciando nas tomadas de decisões. O processo administrativo, de
forma geral, é um mecanismo de controle da atividade pública. Sendo assim, a
participação popular na sua realização é uma forma de potencializar o seu
aspecto democrático.
Por fim, dentre os diversos exemplos
apresentados por Oliveira, é importante citar a consulta pública prevista pela
Lei de Parcerias Público-Privadas (Lei 11.079/2004), conforme lemos em seu art.
10, inciso VI, a seguir transcrito:
VI – submissão da
minuta de edital e de contrato à consulta pública, mediante publicação na
imprensa oficial, em jornais de grande circulação e por meio eletrônico, que
deverá informar a justificativa para a contratação, a identificação do objeto,
o prazo de duração do contrato, seu valor estimado, fixando-se prazo mínimo de
30 (trinta) dias para recebimento de sugestões, cujo termo dar-se-á pelo menos
7 (sete) dias antes da data prevista para a publicação do edital;
O
interessante nesse dispositivo é que as parcerias público-privadas são um
exemplo claro da aplicação do princípio da eficiência em sua acepção mais
clássica. Ao incluir a possibilidade de audiências públicas na confecção dos
editais e dos próprios contratos envolvidos em tais parcerias, podemos observar
o legislador aplicando a abordagem moderna do princípio da eficiência, pois há
o reconhecimento da importância da participação popular na atividade pública.
CONCLUSÃO
O presente artigo buscou apresentar
uma visão atualizada do princípio da eficiência. Por meio de uma abordagem
retrospectiva, apresentamos a evolução do Estado, desde uma concepção liberal,
passando pelo Estado Social de Direito e chegando, finalmente, ao Estado
Democrático de Direito, no qual há ainda a ênfase na busca dos direitos
sociais, mas sob uma perspectiva constitucional e adotando-se um modelo
gerencial de administração pública.
Apresentamos argumentos para
sustentar a superação de uma visão neoliberal do princípio da eficiência e a
adoção de uma abordagem harmonizada com a constitucionalização do Direito
Administrativo. Dentro dessa nova abordagem, a prestação da atividade
administrativa será eficiente quando satisfizer, de forma racional, plena,
célere e econômica, os direitos fundamentais.
Por fim, demonstramos que, para que
o Estado possa satisfazer os direitos fundamentais da sociedade, faz-se
necessário que essa sociedade tenha voz e participe de forma ativa dos
processos decisórios e da execução das políticas e atividade públicas. Dessa
forma, o que se constatou é que a Administração Pública tem o dever de fomentar
a cidadania o que deve ser feito não somente pela democracia representativa,
mas também por meio da democracia participativa.
FONTES
BIBLIOGRÁFICAS
CARVALHO
FILHO, José do Santos. Manual de Direito
Administrativo. São Paulo: Atlas, 2020.
COUTO,
Reinaldo. Curso de direito
administrativo. São Paulo: Saraiva Educação, 2019.
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Alexandre. Manual de Direito
Administrativo. São Paulo:
Saraiva Educação, 2020.
MENDES,
Gilmar Ferreira. Curso de Direito
Constitucional. São Paulo: Saraiva, 2017.
NOHARA,
Irene. Direito Administrativo. São
Paulo: Atlas, 2020.
OLIVERIA,
Rafael Carvalho Rezende. Curso de
Direito Administrativo. Rio de Janeiro: Forense, 2019.