Em seu artigo, Barroso aborda os
fenômenos da judicialização e do ativismo judicial no Brasil, apontando as
diferenças entre eles e as consequências positivas e negativas que geram nos
cenários político e jurídico nacionais. Segundo o autor, a judicialização ocorre quando “questões de larga repercussão
política ou social estão sendo decididas por órgãos do Poder Judiciário, e não
pelas instâncias políticas tradicionais: o Congresso Nacional e o Poder
Executivo” (BARROSO, p. 3). Para o autor, esse fenômeno não é exclusividade do
Brasil, mas algumas de suas causas seriam decorrentes de nossa organização
institucional.
A primeira causa apontada por Barroso foi a redemocratização que levou à promulgação da Constituição Federal de
1988 e que tornou a Justiça brasileira, mais especificamente o Supremo Tribunal
Federal, mais independente e politicamente ativo. Além disso, ela trouxe
conscientização à população quanto à possibilidade de acesso à Justiça com
vistas à proteção de seus direitos. A segunda causa da judicialização foi o que
o autor denomina constitucionalização
abrangente, fenômeno que tornou constitucionais questões que antes
pertenciam ao âmbito legislativo e político. O autor explica que, quando uma
questão é elevada ao nível constitucional, “ela se transforma, potencialmente,
em uma pretensão jurídica, que pode ser formulada sob a forma de ação judicial”
(BARROSO, p. 4). A última causa apresentada pelo autor é “o sistema brasileiro de controle de constitucionalidade” (BARROSO,
p. 4), com sua possibilidade de controle difuso e incidental ou controle
concreto, por ação direta do STF. Esse último aspecto tornou possível o
tratamento pelo STF de praticamente qualquer questão de relevância política ou
moral. O autor explica que a judicialização não se deve à vontade do Judicário:
o STF não tem a opção de se manifestar ou não a respeito de uma ação, desde que
ela preencha os requisitos legais de cabimento. Dessa forma, a judicialização é
consequência do desenho institucional e não de uma postura voluntária do
Judiciário.
Barroso trata em seguida do segundo
fenômeno citado anteriormente, o ativismo
judicial, que seria, diferentemente da judicialização, decorrente de uma
“escolha de um modo específico e proativo de interpretar a Constituição,
expandindo o seu sentido e alcance” (BARROSO, p. 6). A auto-contenção judicial apresenta-se como o fenômeno oposto ao
ativismo, pois pressupõe três atitudes: o judiciário evita agir quando não há
indicação expressa de cabimento de sua ação; utilização de “critérios rígidos e
conservadores para a declaração de inconstitucionalidade de leis e atos
normativos” (p. 7); e abstenção em questões de políticas públicas. Segundo
Barroso, tanto a judicialização quanto o ativismo judicial devem-se a uma crise
extrema no Legislativo que tem instigado o Judiciário a avançar na busca da
defesa da Constituição, uma vez que aquele poder tem se mostrado omisso em suas
funções e ilegítimo no exercício da representatividade.
Para o autor, os fenômenos
apresentados têm uma face positiva e
outra negativa. Do ponto de vista
positivo, o Judiciário tem tratado de questões que aguardavam posicionamento
legal há muito tempo, como por exemplo a greve no serviço público. No entanto,
há um lado negativo, a saber, a exposição das mazelas do Legislativo. Barroso
deixa bem clara a necessidade urgente de uma reforma política que viria a
“fomentar autenticidade partidária, estimular vocações e reaproximar a classe
política da sociedade civil” (BARROSO, p. 9).
O autor apresenta, em seguida, as críticas relativas à intervenção judicial
excessiva na sociedade brasileira. Tais críticas se voltam à ameaça à legitimidade democrática, à politização da justiça e à limitação da capacidade institucional do
Judiciário. Quanto à primeira crítica, o autor explica que há dois
fundamentos que garantem a defesa da legitimidade
democrática por meio da intervenção judicial: um fundamento normativo (previsão constitucional de atuação técnica e
imparcial do Judiciário) e um fundamento
filosófico (o Judiciário é
responsável pela defesa do Estado constitucional democrático). Quanto à segunda
crítica, a politização do Direito, o
autor a rebate afirmando que apesar de não haver um limite claro separando
política e Direito, “em uma cultura pós-positivista, o Direito se aproxima da
Ética, tornando-se instrumento da legitimidade, da justiça e da realização da
dignidade da pessoa humana” (BARROSO, p. 13). Quanto à última crítica, que se
concentra na capacidade institucional
limitada do Judiciário, o autor reconhece a necessidade de que esse Poder
se avalie quanto aos limites de sua capacidade técnica de decisão e aos efeitos
sistêmicos que podem advir de seus posicionamentos, se auto-limitando espontaneamente quando necessário.
Barroso conclui retomando resumidamente cada ponto abordado e apontando
para o fato de que o ativismo judicial, até o momento, tem operado de forma
benéfica, sendo parte da solução para questões que afligem o país há muito
tempo. No entanto, segundo o autor, “ele é um antibiótico poderoso, cujo uso
deve ser eventual e controlado” (BARROSO, p. 19). Para Barroso o problema real,
carente de solução, é “a crise de representatividade, legitimidade e
funcionalidade do Poder legislativo” (BARROSO, p. 19).
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