Texto: CINTRA,
Antônio Octávio. “O sistema de governo no Brasil”, em AVELAR, L.; CINTRA, A. O.
(orgs.). Sistema Político Brasileiro:
uma introdução. Rio de Janeiro: Fundação Konrad-Adenauer-Stiftung; São
Paulo: Fundação Unesp Ed, 2007, pp.59-79.
Cintra aborda a
questão da opção pelo sistema de governo
presidencialista no Brasil de um ponto de vista histórico e analítico. Segundo
o autor, o Brasil estava a caminho de se tornar uma monarquia parlamentarista
quando ocorreu a proclamação da República. No entanto, a baixa participação política,
o caráter oligárquico do sistema político de então e a “identificação entre
parlamentarismo e monarquia” (CINTRA, 2007, p. 60) teriam sido alguns dos
obstáculos para o sucesso de um possível sistema parlamentarista. Apesar disso,
Cintra afirma que havia a presença de traços de competição política e “contestação
pública”, ainda que insuficientes para a caracterização de um regime democrático.
O autor avança
apresentando dados históricos referentes às tentativas de implantação do
Parlamentarismo no Brasil. Segundo Cintra, a preocupação com a formação de um
governo presidencial forte e centralizado impedia que tal implantação ocorresse.
No entanto, afirma que apesar desse aspecto centralizador, a República
apresentava traços consociativos tais como: “o federalismo, o bicameralismo, o
mandato presidencial de quatro anos (...), a representação proporcional (...),
o multipartidarismo e as ‘grandes coalizões’” (CINTRA, 2007, p. 60). Esse
sistema de compartilhamento de poder permitiu que o parlamentarismo
permanecesse uma possibilidade. Com a renúncia de Jânio Quadros, o Ato
Adicional institui o parlamentarismo em 1961, diminuindo o poder presidencial
de João Goulart, eleito vice-presidente. A partir daí o parlamentarismo
adquiriu um “estigma golpista” (CINTRA, 2007, p. 61), sendo rejeitado pela
população no plebiscito de 1963. O Regime Militar de 1964 impossibilitava
qualquer ideia de compartilhamento de poder. Com a redemocratização e a
convocação da Assembleia Nacional Constituinte houve uma nova tentativa, mas a
proposta foi engavetada pelo então presidente Sarney, sendo adotado pela
Assembleia Nacional Constituinte o
sistema presidencialista, com a realização de um plebiscito em 1993 para que a
população opinasse a respeito do assunto. Para Cintra essa decisão “foi
altamente questionável” (CINTRA, 2007, p. 63), dada a complexidade do assunto.
Quanto às razões para
a rejeição do sistema parlamentar, para o autor, acredita-se que a missão de
desenvolver o país deve ser entregue a um líder carismático, cujo poder é
concentrado e advindo da legitimação do voto popular. No entanto, no Brasil,
esse líder “esbarraria no sistema político cheio de pontos de bloqueio à tomada
de decisões e, sobretudo, à implementação delas” (CINTRA, 2007, p. 64). Esse
sistema está baseado em elementos que acabariam por minar o poder da maioria,
tais como congresso pluripartidário, legislativo bicameral, federalismo real,
Judiciário descentralizado e Ministério Público autônomo.
O autor passa à
análise do sistema presidencial brasileiro. Citando Abranches (1988 apud
CINTRA, 2007, p. 65), o autor aponta para as “bases de nossa tradição
republicana”, quais sejam, o presidencialismo,
o federalismo, o bicameralismo, o multipartidarismo e a representação
proporcional. Segundo aquele mesmo
autor, a estabilidade da nossa democracia tem sido ameaçada por um constate
conflito entre Executivo e Legislativo, em cuja base estaria a “fragmentação na
composição das forças políticas” (ABRANCHES, 1988, p. 8, apud CINTRA, 2007, p.
65). A tentativa de solução para essa problemática veio por meio do
“presidencialismo de coalizão”, caracterizado por meio de alianças partidárias.
Segundo Abranches, esse sistema seria instável por depender de uma harmonização
sutil de interesses, ideologias e programas. Em nota, Cintra cita Abranches que
afirma que essa política no Brasil “induz ao clientelismo e à patronagem”,
apesar de ser “uma necessidade intrínseca de nosso sistema” (ABRANCHES, 2005,
p. 44, apud CINTRA, 2007, p. 66).
Cintra apresenta a
síntese de Rennó a respeito das abordagens negativas do presidencialismo
brasileiro. Num primeiro grupo estariam aqueles que criticam a capacidade governativa desse sistema.
No segundo grupo, os que o vêem como um sistema que se move por meio
basicamente da trocas de recursos.
No terceiro grupo, que inclui o próprio Rennó, estariam aqueles que criticam a natureza relação entre Executivo e
Legislativo. Segundo esses críticos, a forma como esse sistema foi
desenhado não postula padrões claros de comportamento, oferecendo, de forma
contraditória, incentivos “que ampliam em demasia a margem de manobra de
governantes e dão muito espaço para que a capacidade individual dos governantes
tenha papel central no gerenciamento da base de apoio no Congresso e na
formação de maiorias” (PEREIRA, POWER, RENNÓ, 2005, apud CINTRA, 2007, p. 71).
Para Rennó, o presidencialismo de coalizão não seria um projeto original e estável,
mas uma tentativa de solução instável e temporária para essa conjuntura
política caracterizada pelo multipartidarismo e pelo consociativismo do sistema
como um todo.
Cintra finaliza o
capítulo apresentando uma análise do presidencialismo estadual e municipal.
Segundo alguns dos autores apresentados por ele, no nível estadual haveria um
ultrapresidencialismo caracterizado pela sobreposição dos governadores sobre as
assembleias legislativas e os órgãos fiscalizadores. No entanto, Cintra cita os
estudos de Fabiano Santos, sobre o Rio de Janeiro, que não confirmam a hipótese
anterior, apresentando um Legislativo autônomo em relação ao Executivo
estadual.
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