terça-feira, 6 de abril de 2010

Jeremias - O profeta da Esperança

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INTRODUÇÃO

Jeremias é apontado como um homem triste e choroso. Para muitos ele é tido como temperamental e neurótico. Entretanto, a leitura cuidadosa do Livro de Jeremias nos revela um homem de grande força interior, capaz de ter e apregoar esperança em meio a um terrível cenário de destruição e desolação. Ele recebeu a Palavra do Senhor e creu nela: creu na chegada de novos tempos em que Deus faria uma nova aliança com Seu povo.

Em diversos momentos o profeta demonstra todo o sofrimento interior que o cumprimento de sua missão lhe causa. Além dos conflitos interiores, ele também sofre perseguições, agressões, prisões e rejeições. Jeremias não pode ser considerado (e não é) um herói-modelo. Não se mostra confiante nem forte o tempo todo. Além disso, não foi sempre bem-sucedido, pelo menos aos olhos dos homens, porque aos olhos de Deus se apresentava como fiel cumpridor da missão a ele conferida. Podem-se perceber diversas semelhanças entre Jeremias e o Messias. O ministério e a missão de Jeremias são perfeitamente retratados na vida de nosso Senhor. Ambos foram homens de dores, experimentados nos trabalhos (Is 53.3). Jeremias também haveria de se perguntar: “Quem deu crédito à nossa pregação?” (Is 53.1; Jr 17.15).

I - BIOGRAFIA DE JEREMIAS

Data de nascimento: provavelmente entre 650 e 645 a.C., nos últimos anos do reinado de Manassés (697-642 a.C.).

Idade à época do chamado (626 a.C., no 13º ano do reinado de Josias (640-609 a.C): aproximadamente 20 anos.

Filiação: filho do sacerdote Hilquias (o mesmo que achou o livro da Lei na Casa do Senhor no 18º ano do reinado de Josias (?)). Provavelmente viria a ser sacerdote como seu pai.

Local de Nascimento: nasceu em Anatote (atual Anata), vila que ficava cerca de 5km a nordeste de Jerusalém, dentro do território de Benjamim. Parece ter sido uma cidade levita dos tempos de Josué (Js 21.18). Era também a cidade de Abiatar, sumo sacerdote da época de Davi. Jeremias poderia ser de sua família (?). OBS.: A tribo de Levi não tinha um território próprio como as outras tribos. Os levitas moravam em vilas situadas dentro do território de outras tribos (Js 13.33; Js 21.1-3).


Estado Civil: solteiro por ordem do Senhor (Jr 16.2,3), pois não haveria esperança para famílias formadas naquela época (Jr 16.4).

Duração de seu ministério: de 626 (13º ano do reinado de Josias) a 586 a.C (queda de Jerusalém).


II - CONTEXTO HISTÓRICO DO LIVRO DE JEREMIAS

- Império da Assíria: alcançou seu apogeu e declínio nos primeiros anos de Jeremias, sob o comando de Assurbanipal, que morreu em 626 a.C., deixando o império totalmente enfraquecido, incapaz de resistir aos ataques dos cimérios e dos citas ao norte e oeste e às invasões dos caldeus e medos ao sul e leste (vide O Império Assírio). Em 612 a.C., Nabucodonosor, comandando um exército unificado de caldeus e medos, cercou e destruiu a capital da Assíria, Nínive. Alguns líderes assírios ainda fugiram para o oeste e tentaram reorganizar o exército, fazendo ainda uma aliança com o Faraó-Neco do Egito, que subiu pela costa Palestina ao encontro dos assírios, derrotando, durante o caminho, a Josias, rei de Judá, que estava em Megido (na Batalha de Megido – 608 a.C.). A aliança assírio-egípcia foi derrotada por Nabucodonosor na Batalha de Carquemis (606-605 a.C.), uma das batalhas mais decisivas do mundo antigo (Jr 46.2). Neco voltou para o Egito envergonhado e a Assíria sumiu para sempre.

- Israel, o Reino do Norte, já havia deixado de existir havia muito tempo: caiu em 722 a.C., durante o cerco organizado por Salmaneser V (e depois por Sargão II), rei da Assíria. Sua queda se deu durante o reinado de Oséias, que seguira o caminho de seus 18 antecessores (vide Reis e profetas de Israel e Judá), levando o povo a continuar em seu caminho de pecado e idolatria (sobre a divisão entre Reino do Norte e Reino do Sul vide Os Reinos de Judá e Israel).





- Em Judá: Manassés reinou por 55 anos, período de grande idolatria e apostasia no meio do povo de Deus. Durante o seu reinado, muitas práticas pagãs foram importadas da Assíria e das nações vizinhas: rituais de fertilidade que envolviam prostituição no templo, sacrifícios a deidades astrais nas ruas de Jerusalém, sacrifícios humanos, principalmente de crianças, nos lugares altos (vide anexo 5, A idolatria de Judá). Ele chegou a sacrificar seu próprio filho a Moloque (II Rs 21.6). As pessoas “adoravam” a Yahweh juntamente com as deidades pagãs (sincretismo religioso). Após sua morte, seu filho Amon sobe ao trono e reina por apenas dois anos, seguindo todos os caminhos de seu pai. Ele foi morto por seus servos em sua casa e seu filho Josias reinou em seu lugar.

- A “reforma de Josias”: Josias foi um bom rei, “fez o que era reto aos olhos do Senhor” (II Rs 22.2). No 18º ano de seu reinado, mandou reparar “as fendas da Casa de Deus”. Durante as obras, Hilquias, o sumo sacerdote, achou uma cópia do Livro da Lei no Templo (Jeremias já havia iniciado seu ministério há cinco anos. Não há registro da participação de Jeremias na reforma, talvez por sua pouca idade). Ao ouvir o conteúdo do Livro Josias rasgou suas vestes e mandou que o sacerdote e outros servos seus fossem consultar ao Senhor acerca das palavras do Livro. Eles foram à profetisa Hulda que assim profetizou:

“(...) Porquanto o teu coração se enterneceu, e te humilhaste perante o Senhor, quando ouviste o que falei contra este lugar e contra os seus moradores, que seriam para assolação e para maldição, e rasgaste as tuas vestes, e choraste perante mim, também eu te ouvi, diz o Senhor. Pelo que eis que eu te ajuntarei a teus pais, e tu serás ajuntado em paz à tua sepultura, e os teus olhos não verão todo o mal que hei de trazer sobre este lugar (...)” II Rs 22.19,20

Josias então dá início a uma reforma espiritual em Judá. Ele manda tirar todos as esculturas pagãs e seus utensílios do Templo, destitui todos os sacerdotes que foram instituídos pelos reis anteriores, desde Jeroboão (I Rs 12.31), para incensarem nos lugares altos (vide anexo 6, texto Lugares altos). Destituiu também os sacerdotes de Baal e destruiu os altares em que eram oferecidos sacrifícios aos deuses pagãos. Josias também fez com que o povo fizesse um concerto com o Senhor (II Rs 23.3). É interessante notar que foi justamente durante o reinado de Josias que a Assíria começou a se enfraquecer em meio às guerras já referidas anteriormente. Daí a liberdade que Josias teve para reestruturar o governo de Judá. Josias morreu em 608 a.C., na Batalha de Megido. Parece que o povo judeu estava apenas aguardando uma mudança na administração de Judá para voltar aos seus maus caminhos.

- Os filhos de Josias: Joacaz, escolhido pelo povo, sucedeu a seu pai no governo de Judá. “Fez o que era mal aos olhos do Senhor” (II Rs 23.32). Reinou por apenas três meses e foi aprisionado pelo Faraó-Neco. Em seu lugar Neco colocou Eliaquim/Jeoaquim, seu irmão. Jeoaquim reinou por onze anos. No quarto ano de seu reinado se deu a Batalha de Carquemis: Nabucodonosor conquistou para a Babilônia todas as terras que antes eram dominadas pela Assíria e pelo Egito. Jeoaquim quebra seu acordo com a Babilônia. Nabopolassar, pai de Nabucodonosor, adoece, obrigando o filho a ficar algum tempo na Babilônia. Entre 599-598 a.C., Nabucodonosor marcha contra Jerusalém. Jeoaquim morre durante o cerco babilônico. Seu filho, Joaquim, o sucede no reino. Durante o seu reinado Nabucodonosor cerca Jerusalém. Ele reina por apenas três meses e é levado cativo para a Babilônia com sua mãe, suas esposas, seus nobres e dez mil pessoas do povo (II Rs 24.6-16) cumprindo-se assim a profecia de Jeremias contra ele (Jr 22.24-30). Matanias/Zedequias, outro filho de Josias, reina por onze anos em lugar de Joaquim. Zedequias, diferentemente dos reis que o antecederam, tratou Jeremias com mais consideração e permaneceu leal à Babilônia por quase dez anos, ao final dos quais cedeu à pressão da “facção pró-Egito entre seus nobres”, recusando-se a colher impostos para a Babilônia. Nabucodonosor então volta a Jerusalém e a cidade é novamente cercada por 18 meses. Zedequias, ao tentar fugir, é capturado e levado cativo para a Babilônia juntamente com grande parte da população. Seus filhos foram degolados em sua presença, seus olhos foram vazados e ele foi amarrado com cadeias de bronze.

- Jerusalém foi tomada em 587-586 a.C.: o Templo, a casa do Rei e todas as casas da cidade foram queimadas e seus muros derrubados. O ouro, a prata e o cobre do Templo foram levados pelos babilônios. Todo o povo foi levado cativo, ficaram apenas os mais pobres para cuidarem das plantações. Judá se tornou uma província do Império Babilônico (vide mapa Impérios Babilônico, Persa e Grego). Gedalias, membro de uma família judaica de respeito, é instituído governador sobre Judá. Dois meses depois ele é assassinado e os remanescentes do povo fogem para o Egito com medo de possíveis represálias por parte de Nabucodonosor. Jeremias, que estava presente na queda de Jerusalém, foi forçado, juntamente com Baruque, a ir com o grupo para o Egito.


III - A POSTURA E A PREGAÇÃO DE JEREMIAS

“Antes que eu te formasse no ventre, eu te conheci; e, antes que saísses da madre, te santifiquei e às nações te dei por profeta.” (Jr 1.5)

- Vocação: na perspectiva teológica pode ser definido como “o chamado que Deus dirige ao homem a quem Ele escolheu para si e que destina a uma obra especial no Seu plano de salvação e no destino de Seu povo. Na origem da vocação há, portanto, uma eleição divina; no seu termo uma vontade divina a cumprir [...]” (DUFOUR apud CÉSAR, 2002, p.21). Percebe-se que há diferenças em relação ao conceito secular de vocação.

- Jeremias tentou se esquivar da missão a ele conferida. “Ah! Senhor JEOVÁ! Eis que não sei falar; porque sou uma criança [na’ar]” (Jr 1.6). O vocabulário hebraico na’ar tem ampla significação: ‘menino’, ‘adolescente’ ou ‘jovem’. Salomão também argumentou de forma semelhante (I Rs 3.7). Moisés também alegou incapacidade (Ex 4.10-14). O senhor encorajou a todos, assim como o fez com Josué (Js 1.6-8; Ex 4.11-12, 14-17; I Rs 3.11-14; Jr 1.7-10). Quem nos capacita é o Senhor que nos comissionou (II Co 3.4,5).

- O chamado de Jeremias: “Olha, ponho-te neste dia sobre as nações e sobre os reinos, para arrancares, e para derribares, e para destruíres, e para arruinares; e também para edificares e para plantares” (Jr 1.10). O profeta era um homem gentil e sensível chamado para uma missão devastadora. Somente o Senhor, por meio do Espírito Santo, nos capacita a cumprir as missões que Ele mesmo nos atribui (At 1.8)

- Jeremias não era populista. O mundo odeia aqueles que carregam a Palavra de Deus (Jo 17.14). Jeremias sentiu na pele o ódio e o rancor daquela geração corrupta, que não queria se converter dos seus maus caminhos. A voz do povo não era a voz de Deus. Assim como Jeremias, somo chamados a proclamar a Palavra de Deus, de forma íntegra: um Evangelho completo, incluindo a denúncia do pecado e o anúncio do juízo vindouro (I Pe 2.9; Mc 16.15,16).


CONCLUSÃO:
“Deveras o meu povo está louco, já não me conhece; são filhos néscios, e não inteligentes; são sábios para mal fazer, mas para bem fazer nada sabem.
Observei a terra, e eis que estava assolada e vazia; e os céus, e não tinham a sua luz.
Observei os montes, e eis que estavam tremendo; e todos os outeiros estremeciam.
Observei, e vi que homem nenhum havia; e que todas as aves do céu tinham fugido.
Vi também que a terra fértil era um deserto; e todas as suas cidades estavam derrubadas diante do SENHOR, diante do furor da sua ira.” (Jr 4.22-26)


Jeremias foi chamado em uma época de grandes mudanças no Oriente Médio. Trata-se de um período de grande convulsão política em que Judá seria castigada por várias nações. O chamado de Jeremias incluía denunciar o estado deplorável em que se encontrava o povo escolhido do Senhor, anunciando a destruição da terra como castigo pelas suas apostasias. Ao mesmo tempo em que anunciava o castigo divino, o profeta pregava a esperança de restauração depois do arrependimento. Essa mesma esperança nos foi oferecida na cruz do Calvário (Jr 31.28-34)

Jeremias descreve a visão de uma Judá assolada pelos babilônios, uma terra deserta, cujos montes e outeiros, antes representantes da firmeza da terra, agora tremiam, dado o abalo a que a terra fora submetida. Esta terra cujos habitantes eram tão numerosos quanto as estrelas do céu (Gn 15.5), agora estava desabitada, nem aves nos céus podiam ser vistas. Os judeus perderiam as bênçãos que lhes foram prometidas havia milhares de anos, por causa de sua desobediência, por não conhecer ao Senhor.

Nenhuma outra nação abandonava seus deuses, e nem eram deuses. Mas Israel abandonou o seu Deus, o Deus dos deuses, que é a sua Glória, para ir após deuses que nada podiam fazer, que não valiam nada. Israel deixou o Manancial de águas vivas para abrir “cisternas rotas”, obras de suas próprias mãos. A idolatria de Judá pode ser hoje encontrada na vida de pessoas que trocam a glória de servir a Deus por uma vida de satisfações pessoais. São pessoas que não servem ao Senhor do Exércitos, mas moldam com suas próprias mãos uma divindade adequada à suas vidas, suas rotinas, suas disponibilidades, seus desejos e projetos, assim como fez Jeroboão (I Rs 12.26-33). O Senhor não nos chamou para servirmos a nós mesmos, mas para que nos prostremos ante Sua majestade, oferecendo e depositando nossas vidas por completo em suas mãos.


BIBLIOGRAFIA

Bíblia de Estudo Plenitude, Barueri, SP: Sociedade Bíblica do Brasil, 2001

BARBOSA, Francisco A., Artigo “Jeremias, o Profeta da Esperança”, disponível em
. Acesso em 30/03/2010

BARBOSA, Pb. José Roberto A., Artigo “Jeremias, o Profeta da Esperança”, disponível em . Acesso em 30/03/2010

GERMANO, Pr. Altair, Artigo “Jeremias, o Profeta da Esperança”, disponível em . Acesso em 29/03/2010

JESUS, Ev. Isaías de, Artigo “Introdução – Jeremias”, disponível em . Acesso em 29/03/2010

MACÊDO, Sulamita, Artigo “Jeremias, o Profeta da Esperança”, disponível em . Acesso em 30/03/2010
Por Lorena Brandizzi, 04/04/10

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